Aids 2016 Balanço

Aids 2016/Balanço:

Tom mais politizado e investimento nas populações-chave estão entre os destaques enumerados pelos participantes da 21ª Conferência Internacional de Aids

Durante os cinco dias em que aconteceu em Durban (África do Sul) a 21ª Conferência Internacional de Aids, cerca de 15 mil pessoas morreram no mundo. Foi o que disse na cerimônia de encerramento do evento, nesta sexta-feira (22), a nova presidente do IAS (International Aids Society), a sul-africana Linda Gall-Becker. No palco, ela recebeu o cargo de  Chris Beyrer, primeiro gay assumido a presidir o IAS.

“Precisamos nos unir para que 2016 seja lembrado como o início da era da PrEP (profilaxia pré-exposição)”, disse Beyrer,  referindo-se ao medicamento que previne HIV e deve ser aprovado no Brasil até o fim de 2016.

A cerimônia começou com um protesto. Representando os profissionais do sexo, ativistas abriram guarda-chuvas vermelhos, símbolo da categoria. “A criminalização afeta nossos direitos humanos e em saúde e as pesquisas comprovam que aumenta nossas chances de adquirir HIV.  Queremos que vocês nos ajudem”, discursou uma das ativistas.

A ucraniana Svitlana Moroz, da Rede Eurasiana de Mulheres sobre Aids, também se manifestou.  “Como sociedade civil, queremos chamar a atenção de vocês para a situação catastrófica do Leste Europeu e da Ásia Central, duas únicas regiões onde as novas infecções e mortes ainda crescem”. Moroz se posicionou contra a criminalização das pessoas com HIV e dos grupos afetados: “A criminalização está nos matando, nos afasta do tratamento.”

A cientista social sul-africana Olive Shisana, co-presidente da conferência concordou. “Para revigorar a resposta ao HIV, precisamos de um movimento de justiça social similar ao movimento global anti-apartheid. Precisamos lutar contra a criminalização das populações afetadas, e isso não ocorrerará sem ativismo.” E pediu para a plateia aplaudir os ativistas.

“Nós, as transgênero, estivemos representadas nessa conferência, e consolidamos parcerias. Eu desafio todos vocês a lutarem por aqueles que são empurrados para as margens da sociedade. Não podemos ignorar o sofrimento das LGBT, especialmente as mulheres trans, que têm 49 vezes mais chance de ter HIV”, falou a  ativista trans sul-africana Duncan Moeketse, do Global Network of Young People Living with HIV (Y+).

A conferência reforçou o comprometimento com os direitos das mulheres e população LGBT, refletindo a composição da presidência do evento, compartilhada entre Beyrer, um homem gay, e Shisana, uma mulher negra sul-africana.

No fim da cerimônia de encerramento, um vídeo convidou a todos para a próxima conferência internacional, que será realizada em 2018 em Amsterdã. O vídeo mencionou aspectos da Holanda que a destacam na resposta ao HIV: respeito aos direitos humanos, participação comunitária e um nível relativamente baixo de estigma em relação ao HIV.

Repercussão

A Agência de Notícias da Aids ouviu gestores e ativistas de vários países que estiveram entre os cerca de 15 mil participantes da 21ª Conferência Internacional de Aids. Veja o que eles disseram:

Adele Benzaken, diretora do Departamento de HIV, Aids e Hepatites Virais do Brasil: “Discutimos grandes temas, como a estratégia 90-90-90,  da qual o Brasil  foi o primeiro país  a adotar algumas diretrizes. Vamos dar ênfase nas populações-chave e como trabalhar com jovens HSH. Talvez tenhamos novos instrumentos para passar a mensagem de prevenção e pensar o que não funciona. Os jovens estão ligados em tecnologias. O mundo precisa modernizar as estratégias de prevenção combinada para conversar com eles.”

Américo Nunes, do Mopaids e do Instituto Vida Nova, São Paulo:  “Comparando com a conferência da Austrália, em 2014,  houve uma politização dos ativistas sul-africanos – notei isso em tudo que participei. O investimento no protagonismo da juventude ficou muito forte. Há um grande investimento financeiro na África com fomento para as ações se tornarem políticas públicas. Aconteceram muitas manifestações pedindo acesso a tratamentos e mais qualidade de remédios, as profissionais do sexo tiveram uma grande oportunidade de se expressarem, ficaram muito claras as questões da implementação da PrEP (profilaxia pré-exposição).  A crise financeira foi apresentada com veemência, assim como estudos científicos para populações- chave. Senti falta de trabalhos sobre lipodistrofia.  E ficou uma interrogação grande sobre como nós vamos enfrentar o estigma e o preconceito.”

Maria Clara Gianna, coordenadora do Programa de DST/Aids do Estado de São Paulo:  “ Gostei, tivemos ótimas discussões. O conceito de vulnerabilidade voltou com força total desde a mesa de abertura.  A conferência nos deixa com grande expectativa em relação à implantação  da PrEp. O desrespeito aos direitos humanos relacionados à orientação sexual e identidade de gênero em diferentes regiões do planeta segue  inadmissível.”

Kwandiswa Mdletshe,  voluntária na conferência,  da África do  Sul: “Tive a oportunidade de conhecer gente do mundo inteiro. Vi que as pessoas com aids têm apoio, suporte, mas precisam de mais ações assim.”

Laylla Monteiro, educadora comunitária, Rio de Janeiro: “Foi minha primeira conferência.  Adorei ver e acompanhar que as trans tiveram um espaço maior. Nos incluir na pauta ajuda a quebrar a invisibilidade, pois passam a nos olhar e nos considerar em pesquisas.”

Janet Bhila, ativista do Zimbabue:  “Gostei muito. Percebi um envolvimento maior dos jovens. É importante chamá-los para auxiliar no planejamento e na implantação de ações multifacetadas de prevenção.”

Josias Freitas, coordenador de recrutamento e retenção do laboratório  de DST/Aids da Fiocruz,  Rio de Janeiro: “Estou estreando em conferência de aids. Uma oportunidade única, maravilhosa. Penso que os governos deveriam investir mais nos profissionais que estão na ponta,  para que tenham uma bagagem melhor e mais vontade de trabalhar.”

Jurandir Telles Silva , da associação  Musas de Castro Alves, Bahia: “Foi minha primeira participação em uma conferência internacional. Espero que todos levem as experiências que aqui ouvimos aos seus pares. Muitas das inovações e discussões, nós já temos no Brasil, como o testar e tratar. Fora isso, foi muito importante e enriquecedor conhecer e vivenciar outras culturas.”

Rubens Duda , do Programa Municipal de DST/Aids, de São Paulo: “Espero que os projetos que acompanhamos aqui sejam incorporados e transformados em políticas públicas. Senti uma autonomia maior dos militantes africanos.”

 Futha Muzunze,  ativista,  África do Sul:  “ A conferência foi muito boa, mas  cara, o que impediu que mais pessoas pudessem participar. É preciso pensar mais na cura do que em negócios que são produzidos aqui pelos interessados em negociar com a saúde de todos.”

Heliana de Moura, das Cidadãs PositHIVas, Belo Horizonte: “O termo vulnerabilidade esteve muito presente. A questão de gênero, quando falamos de preconceito em relação ao machismo e à misoginia, está presente em várias partes do mundo. No Brasil, África do Sul, Quênia… Percebi esta similaridade aqui.”

Moysés Toniolo,  da Rede Nacional de Pessoas Vivendo com HIV e representante do movimento de aids no Conselho Nacional de Saúde, Bahia: “Muito esclarecedor repensar o que era  considerado antigo na cultura de prevenção. Muitas ações que considerávamos ultrapassadas ainda são necessárias em outras partes do mundo. Por exemplo, a promoção de preservativos, a utilização do exame de CD4 — questões relacionadas ao cuidado são presentes e atuais em muitos países.”

Fábio Mesquita,  ex-diretor do Departamento Nacional de DST/Aids e Hepatites Virais do Brasil: “ O congresso foi excelente para atualizar informações.  Considero destaques importantes as questões relacionadas a discriminação e direitos e às  inovações tecnológicas,  como a PrEp e outras.”

Monica Malta, pesquisadora da Fiocruz,  Rio de Janeiro:  “Acompanhei muitas mesas coordenadas por trans. Considero esta abertura de espaço para além do Global Village um ponto positivo.”

Adriana Bertini, artista, ativista, Sao Paulo: “Busquei mais projetos de prevenção feitos com preservativos. Além de meu trabalho, vi apenas o Condommize. Seria importante promover mais o uso do preservativo para que a adesão a este insumo e a mudanca de comportamento aconteçam.”

Jesus Guillen, ativista de São Francisco, Califórnia (EUA): “Eu,  primeiro,  quero dizer que me sinto muito agradecido por poder estar aqui e acompanhar este encontro. Vivo com aids há 30 anos.  Minha crítica é de que não vi nenhuma mesa de pessoas vivendo com a doença há muito tempo. Se não obervarmos o passado, não ajudaremos a construir um futuro melhor.”

Tânia Corrêa, do CRT (Centro de Referência e Treinamento em DST/Aids de São Paulo): “Foi difícil chegar [leia matéria sobre a dificuldade], mas valeu a pena. É a minha segunda conferência. Relevante acompanhar como outros países lidam com  os desafios da aids. Vimos que nós,  no Brasil, em São Paulo, estamos caminhando bem. Mas existem sempre desafios em comum e questões que temos de trabalhar melhor. A vinculacão após o diagnóstico, a  garantia de retenção no serviço e tratamento.”

Ricardo Martins, psicólogo do  CRT, São Paulo:  “Foi fundamental pensar  sobre as populações-chave, as novas estratégias para alcançá-las, de fato,  e para reduzir de vez a expansão de novos casos. [leia mais]”

Kate Alexander, ativista do Canadá: “Foi uma ótima experiência global porque tivemos a oportunidade de encontrarativistas do mundo todo e trocar muita experiência.”

Nereu Mansano, assistente técnico do Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde, de Brasília: “Gostei bastante de participar. O nível foi excelente e pude observer a dimensão dos avanços no combate à pandemia. Temos muito o que caminhar em termos de mundo, retomar a estratégia de prevenção e manter a prevenção combinada de verdade.”

Diego Callisto, assistente técnico do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais:  “Faltaram mais discussões sobre a população HSH e gays nas sessões oficiais. Fiz um roteiro e não identifiquei tanta coisa. Diversos aspectos fizeram parte das sessões de juventude e, consequentemente,  a construção de estratégias para jovens e adolescentes que têm vulnerabilidades distintas.”

Shamilah Batte, ativista,  da Uganda:  “ Foi uma excelente oportunidade de encontrar pessoas e novas ideias diferentes para, juntos, enfrentarmos a aids.”

Laurel Sprague, da ONG HIV Justice Network e representante da sociedade civil da América do Norte na Junta Coordenadora do Programa (PCB, em inglês), do Unaids, EUA:  “Eu estive trabalhando e não tive muita oportunidade de sentir o clima geral. Mas fiquei satisfeita com reuniões que fizemos com ativistas internacionais, em que foram discutidas táticas de militância. Mas o que ouvi de outros participantes foram queixas sobre o clima otimista, de comemorar os avanços, quando ainda temos metade das pessoas com HIV no mundo sem tratamento. Tem muita gente por aí perdendo mãe, perdendo filhos, perdendo parceiros.”

Carlos Garcia de Leon, do MSMGF Fórum Global de Homens que Fazem Sexo com Homens: “Senti falta de uma maior mobilização da sociedade civil e de representação latino-americana.”

Sergio López, da ONG GayLatino, do Paraguai: “Estamos em um momento de articulação de organização da sociedade civil LGBT da América Latina e comunidades latinas em outras partes, para o que contribuiu a mobilização em torno da Reunião de Alto Nível sobre HIV/aids das Nações Unidas. Mas não vi o reflexo desta articulação aqui.”

George Ayala, MSMGF, Califórnia (EUA):  “A discussão sobre populações-chave teve destaque nessa conferência, e estivemos representados e articulados aqui.  Hoje mais cedo, tivemos a oportunidade de discutir as consequências da exclusão das populações-chave na de declaração da Reunião de Alto Nível sobre HIV/aids das Nações Unidas, que dá permissão aos governos para nos ignorarem em seus planos, inclusive no financiamento.”

Matías Muñoz, Red Argentina de Jóvenes e Adolescentes Positivos (RAJAP): “É a primeira vez que venho e foi uma ótima experiência. Mas senti certa falta de compromisso dos participantes. Essa plenária final está esvaziada”

Denise Rinehart, assessora técnica do Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde (Conasems), Brasília: “Foi marcante a fala da Cherlize Theron sobre desigualdade. Percebo que essa discussão está enfraquecida no SUS, que é um espaço privilegiado para esse debate ocorrer.”

Cleiton Euzébio de Lima, do Unaids Brasil: “Nessa conferência, falamos dos avanços que tivemos mas também demos destaque aos enormes desafios que ainda temos por enfrentar.”

Henrique Contreiras, colaborador da Agência de Notícias da Aids, de Durban. Com depoimentos a Henrique Contreiras e Roseli Tardelli

A Agência de Notícias da Aids cobre a 21ª Conferência Internacional de Aids, em Durban (África do Sul), com apoio do Departamento de DST, Aids e Hepatites Virais, da DKT do Brasil e da Jansen Farmacêutica.

http://agenciaaids.com.br/

“A minha geração, por ter nascido com HIV, foi educada para morrer”

“A minha geração, por ter nascido com HIV, foi
educada para morrer”

Jovem de 26 anos mostra como aprendeu a conviver com o vírus e a superar as dificuldades

Aline Ferreira nasceu com o vírus HIV Eduardo Enomoto/R7

Aline Ferreira do Nascimento nasceu com o vírus HIV. Em seus primeiros anos de vida, os pais morreram em decorrência de complicações da Aids e a jovem foi adotada pelos tios.

Hoje, 26 anos depois, ela aprendeu a lidar com o preconceito e as diferenças. No quarto ano do curso de Psicologia, ela faz estágio na área e mora com o irmão mais velho em São Paulo.

Conheça a história de Aline:

DIAGNÓSTICO
Tenho 26 anos e eu sou de transmissão vertical, que é quando nasce com o vírus. Meu pai descobriu primeiro, adoeceu e entre adoecer e morrer foi bem rápido. Minha mãe ainda ficou um tempo [viva] depois que adoeceu. Os dois morreram em decorrência dos agravos da Aids.  Temos várias hipóteses [sobre a transmissão]. Pode ter sido na hora do parto, via amamentação já que ela me amamentou o tempo inteiro, até quando já estava bem adoecida. Nessa época não existia uma orientação. Ela fez pré-natal, mas acho que naquela época ainda não era obrigatório exame de HIV. Logo que meu pai faleceu eles pediram o exame de nós três — eu, minha mãe e meu irmão — e foi constatado na minha mãe e em mim.

Eu fui adotada pelos meus tios. Meu pai adotivo é irmão do meu pai biológico e eles já tinham três filhos. Na época, foi um processo bem doloroso porque grande parte da família queria meu irmão porque ele era saudável mas existia até uma pressão dos médicos para que eu ficasse com a minha mãe porque não achavam que eu ia ter muita chance de vida. Então eles achavam que, como eu ia morrer de qualquer jeito, era mais humano eu morrer com a minha mãe do que fazer esse processo de adoção, que ela fez em vida. Meus pais decidiram adotar a gente justamente para evitar que a gente ficasse separado.

Durante a infância foi bem difícil porque minha mãe tinha muito medo que eu adoecesse então eu não frequentava escola. Ela me alfabetizou em casa e eu fazia uma avaliação de dois em dois ou de três em três meses. E foi assim que eu fui sendo aprovada. Já na adolescência, com uns 14/15 anos, é que ela foi percebendo que não dava para ficar só em casa e foi quando eu comecei a frequentar a escola, sair mais. Minha mãe sempre disse que eu ficava em casa por causa do HIV, embora eu achasse injusto porque eu tinha irmãos e via os meus irmãos com a vida deles, comum, e eu dentro de casa. Mas ela sempre me contou que foi por causa disso.

A minha geração, por ter nascido com HIV, foi uma geração educada para morrer, porque demorou muito tempo para que os nossos pais e as casas de apoio entendessem que a gente tinha uma vida, que podia tomar conta dela, mas a gente ficava o tempo inteiro, a cada aniversário achando que ia ser o último. Por mais que a gente estivesse bem e saudável. O HIV era maior e engolia tudo.

ACEITAÇÃO
Onde eu moro é um bairro pequeno, em Embu Guaçu. Quando os meus pais faleceram foi um acontecimento que demorou para abafar. Durante muito tempo eu fiquei marcada como sendo a filha do casal que morreu de Aids. Então na escola todo mundo já sabia. Ninguém falava nada para mim, mas eu ouvia comentários sobre banheiro, de mães que não queriam que eu frequentasse o mesmo banheiro que as outras crianças. Tem um dado momento, já quando eu ia para a escola, em que eu caio na quadra e aí paralisam tudo, suspendem a aula de educação física porque eu estava machucada na quadra. Foi difícil para eu aprender a lidar com essas situações porque até então era minha casa, minha família e era mais fácil. Do lado de fora doía mais.

Despois de um tempo, meu irmão decide fazer cursinho pré-vestibular, e eu achei que seria um bom momento para eu começar a ter uma vida normal. Era longe de casa, até fui morar em Santo Amaro para fazer cursinho. E foi ali que comecei a tomar conta da minha vida mesmo, de fato. Já tinha 17 anos. Fiz cursinho muito tempo, uns quatro anos, e eu queria muito a USP mas não conseguia passar na segunda fase e fui para a PUC fazer psicologia. Estou no quarto ano.

Culpa eu não senti muito. Mas raiva eu tive, principalmente na infância, de me questionar “por que só eu e meu irmão não?” Eu olhava meu irmão com uma vida normal e eu tinha que ficar em casa. Já passei por momentos assim inclusive de não conseguir lidar com meu irmão porque olhar para ele era olhar para uma vida que eu não ia ter. E eu achava que eu não ia ter. Já teve fase de eu achar que minha vida era ficar no quarto, que eu não ia estudar, não ia trabalhar, nada.

RELACIONAMENTOS
Demorou [para acontecer]. Primeiro porque eu sou uma filha bem alimentada do patriarcado. Minha mãe é bem rigorosa. Educou a mim e a minha irmã para casar e ter filho. E isso já era dificultado, mais o fato de eu ter demorado muito para me socializar. Então eu era supertímida, de não conseguir falar com ninguém e isso dificultou muita coisa. Meu primeiro namorado terminou comigo depois que eu contei do HIV. Eu tinha 17 anos e ficamos poucos meses juntos e ele ouvia as pessoas falarem que eu tinha [HIV] e achava que era brincadeira. Um dia ele me perguntou e eu confirmei. Ele quis terminar e disse que não ia conseguir ter uma vida normal. Agora estou com um menino, mas nos conhecemos em um grupo [de discussão HIV] e ele me conheceu falando disso. Mas já teve relacionamento em que eu não falei nada, começou e terminou sem saber, mas já teve relacionamento de eu falar logo de cara. Vai da pessoa.

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TEMOS QUE FALAR SOBRE ISSO
No começo, quando eu era adolescente, não precisava contar porque todo mundo sabia. Quando mudo de casa eu passo por um momento que eu queria que ninguém descobrisse por nada. Mesmo na casa da minha vó eu tirava rótulo dos remédios, guardava o mais escondido que eu podia, não falava sobre isso, não tocava no assunto. Depois comecei a pensar que não falar talvez fosse um preconceito contra mim mesma. Não falar era uma forma de eu não entrar em contato com essa história que é minha e faz parte de quem eu sou hoje. E é quando eu começo a mudar um pouco e a frequentar algumas ONGs para eu entender como eu falaria disso para outras pessoas até chegar nesse ponto em que eu falo normal.

Sempre comento que a gente mudou muito no manejo do HIV, as medicações, coisas mais fáceis, menos efeitos colaterais, mas não mudamos a forma de viver com HIV. Ainda é muito difícil falar sobre isso, ainda tem gente que pega resultado positivo e acha que é o fim do mundo, que se desespera, até porque a gente não pensa no HIV só como um possível adoecimento. Tem todo o estigma, uma história, você já se coloca em um lugar de culpa, de achar que mereceu por um motivo ou outro. O HIV está colocado ao lado de algo que não é bem visto na sociedade. É colocado ao lado de uma sexualidade tida como errada, uma promiscuidade e ainda é muito difícil falar sobre isso, mas quando a gente coloca em discussão a gente coloca N outras coisas em discussão como a forma de lidar com o próprio corpo, de como a gente se coloca no mundo, a gente não está falando só do HIV, a gente está falando de um vírus que foi colocado em um momento histórico em várias caixinhas e falar dele é falar sobre essas caixinhas. Por isso eu acho importante.

Já aconteceu de eu passar em pronto socorro com uma enxaqueca e falo que faço tratamento de HIV e o médico vem com um sermão superpreparado: “Ah vocês, meninas que não se cuidam, que dormem com todo mundo”. Eu comento que nasci com HIV e é um choque para eles. E falar que eu nasci com isso é colocar que mesmo se eu estivesse transando com todo mundo também seria um direito meu. Então tem essa dificuldade dos médicos. Nem todo pronto socorro aceita atender quem tem HIV. Dizem que não sabem medicar e transferem para hospitais de referência. Eles falam que é por causa da medicação, mas acho estranho e me faz pensar que formação é essa que estão tendo em que você não sabe medicar alguém que faz tratamento antirretroviral. É bizarro. Mas é bem comum.

TRATAMENTO
Nesse momento eu não tomo medicação. É uma questão bem polêmica. Eu decidi não tomar porque eu já tomava há muito tempo e como eu já estava indetectável eu pedi para parar um tempo. Com o vírus controlado é possível [parar], o que não pode é abandonar o tratamento. Dar tchau e pronto. Eu faço exames regularmente para ver como está a carga viral e estamos sempre em estado de alerta. Vai fazer quase dois anos que parei e está tudo certo nesse período, mas sou um ponto fora da curva. Geralmente quando para a chance de adoecer é bem maior e sei que vou ter que voltar, mas uma das substâncias que eu tomava tem uns sintomas bem psicóticos. Eu tinha uns delírios, insônia, dor de cabeça. Era difícil lidar porque eu já estava na universidade e eu não conseguia fazer prova, não conseguia sair de casa.

PREVENÇÃO
Acho que primeiro é falar de outras tecnologias possíveis e usar outras formas de chegar [nas pessoas]. O GIV [Grupo de Incentivo à Vida, onde Aline atua com o grupo de jovens] está com um projeto de arte urbana, falar de prevenção com lambe-lambe, grafite, que acho que é melhor do que ficar no farol entregando camisinha. E tem que estar em outros espaços. As ações ficam muito no centro e com o público gay, o que acaba marcando de novo todo o estigma e o estereótipo. É importante diversificar e lembrar que na periferia também tem HIV, que quem morre mais são as mulheres negras, ir para esses espaços, com outra linguagem, com outra forma de chegar. A que a gente não é educado para prevenção, a gente vai ao médico quando estamos muito doentes e a estrutura de saúde é pensada assim. Tem uma estrutura básica sucateada e se investe em áreas especializadas, UTI, grandes obras. Temos que mudar nossa própria concepção se saúde, temos que conseguir falar de HIV e DSTs e todo o resto com naturalidade, sem toda essa moralidade que eles colocam. E hoje não faz nenhum sentido [pensar em limitações]. Eu não deixo de fazer nada por conta do HIV, a vida segue.

fonte http://noticias.r7.com/

Aids: bispo brasileiro denuncia falta de acesso ao tratamento

Aids: bispo brasileiro denuncia falta de acesso ao tratamento

Crianças sofrem sem remédios na África – REUTERS

Durban (RV) – Está em andamento em Durban, na África do Sul, a 21ª Conferência Internacional sobre Aids. A ONU calcula que 36,7 milhões de pessoas vivem com o vírus em todo o mundo.

Num painel de Alto Nível sobre Acesso ao Tratamento, o Secretário-Geral das Nações Unidas, Ban Ki-moon, ressaltou que, atualmente, 20 milhões de pessoas não têm acesso ao tratamento do vírus HIV.

Estes números espelham a realidade de Moçambique, como confirma o Bispo de Pemba, Dom Luiz Fernando Lisboa, onde o número de pessoas infectadas com o HIV no país pode chegar a 16% da população:

Segundo o Fundo das Nações Unidas para a Infância, Unicef, o número de mortes relacionadas à Aids entre adolescentes de 15 a 19 anos mais do que dobrou desde 2000.

Meninas

Em 2015, em todo o mundo, houve uma média de 29 novas infecções por hora nesta faixa etária.

A agência alerta que meninas são particularmente vulneráveis, representando até 65% de novas infecções entre adolescentes em todo o mundo.

OUÇA A ENTREVISTA ACESSANDO O LINK

http://br.radiovaticana.va/news/2016/07/20/aids_bispo_brasileiro_denuncia_falta_de_acesso_tratamento/1245449

http://br.radiovaticana.va/